terça-feira, 22 de dezembro de 2020

Coronavírus mutante?

Nessa última semana vários meios de comunicação divulgaram que uma nova mutação do SARS-CoV-2 foi identificada no Reino Unido. Ao que tudo indica, essa nova variedade é de transmissão mais fácil. Em Londres, já se estima que 60% dos vírus circulando pertençam a essa cepa, supostamente 70% mais transmissível do que o SARS-CoV-2 “comum”.

Não é a primeira vez que identificamos mutações do SARS-CoV-2. Elas estão sendo acompanhadas desde o início, e nos ajudam a saber a trajetória do vírus pelo mundo. Foi estudando essas mutações que descobrimos que as cepas de SARS-CoV-2 que circularam em Nova York em abril vieram da Europa (e não diretamente da China, ao contrário das cepas que circularam mais cedo na Califórnia e no estado de Washington). Também foi estudando elas que descobrimos que o vírus entrou no Brasil mais de cem vezes entre fevereiro e março, vindo da Europa e dos EUA.

Na realidade, a mutação é uma consequência esperada da circulação de um vírus. A cada célula invadida e a cada cópia que ele faz, há uma pequena chance de que durante a replicação uma letra no seu código genético (que no caso do SARS-CoV-2 é feito de RNA) seja escrita de forma errada. Ou seja, é produto da boa e velha seleção natural.

A maior parte das mutações é inócua para o vírus, e algumas prejudicam ou mesmo impedem sua replicação. Mas muito raramente, surge uma que dá ao vírus uma vantagem competitiva em relação aos outros vírus que não a possuem. No caso do SARS-CoV-2, provavelmente ela dá origem a uma proteína spike que se encaixa com mais facilidade no receptor ECA-2 das nossas células, facilitando sua entrada.

Importante: essa mutação faz com que o vírus seja mais transmissível, mas até agora não foi identificada nenhuma associação com formas mais graves de CoViD-19 ou com a ocorrência de determinados sintomas. Além disso, pelo que temos visto nas mais de meio milhão de pessoas já vacinadas no Reino Unido, a vacina da Pfizer-Biontech protege também contra essa nova cepa.

Obs.: também não quer dizer que o vírus esteja evoluindo para se tornar menos agressivo. Essa história de que com o passar do tempo os vírus se “adaptam” ao hospedeiro e se tornam menos agressivos nem sempre é verdade. Eles tendem a se tornar mais transmissíveis, mas isso não necessariamente significa menor agressividade ou letalidade. Para mais detalhes, deem uma olhada no meu texto sobre o “apocalipse zumbi” dos coelhos da Austrália.

Também importante: vários países estão barrando pessoas vindas do Reino Unido. Muito provavelmente isso é inútil, porque essa variante já está circulando em outros países. A diferença é que o Reino Unido tem uma capacidade enorme de analisar e processar amostras do vírus e de identificar mutações. Não é sequer possível bater o martelo e dizer que essa mutação surgiu lá. E definitivamente ela não é a única: a África do Sul identificou recentemente uma variedade de SARS-CoV-2 circulando no país que também aparenta ser mais transmissível.

O que fazer para se proteger?

Pois bem: nem a variante identificada no Reino Unido nem a da África do Sul têm mais capacidade de atravessar máscaras, sobrevivem melhor ao álcool 70° ou flutuam mais longe no ar. Uso de máscaras, higiene das mãos e distanciamento social seguem como as melhores alternativas contra essa cepa!

(E contra todas as outras, diga-se de passagem)  

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